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Archive for the ‘Crônicas’ Category

Temperaturas

Eu sei que são três e cinco enquanto o moço pincela perfume de margarina sobre o milho quente. Meus dentes escorregam em delícia como quem entra no país de Alice.

O pianista do café da esquina arranha um jazz e o inverno me vem precoce na tua ausência.

Só agora noto que a parede descasca.

Por que a gente só ouve “My funny valentine” depois que os amores se vão…

O apetite vai comprar cigarros e não volta. Como você…

Enterro meu corpo em leituras e textos. Quem sabe os dias passam.

Autores me oferecem sorrisos sem data de vencimento.

Um dia novo, num mês outro chega e eu agradeço o vizinho por aumentar o som da vitrola. “Chovendo na Roseira”… Tom Jobim me lembra o recomeço. Primaveras…

O passado pede licença e se recolhe como a boa e velha música clássica na estante, para uma tarde ser apreciado sem me depreciar.

Já não são mais três e cinco. A vida pega bicicleta e dá voltas. Abre o sol. Eu também.

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Fora do Compasso

Original não é apelido de cerveja; please, criaturas, criai-vos! Ao invés de brioches, criatividade para esse povo que vive da chepa das imitações baratas. Sem demagogias, pulo o couvert e vou direto aos finalmentes: vai ver se eu cover lá na esquina! Que xerox é coisa de quem não pinta a vida com pilot Lumicolor. Cada olho tem uma côr para as entrelinhas do verso. Aliás, algum idiota espalhou que para fazer poema tem que combinar o fim das palavras. A estatística me faz estática e o mundo estético me faz apática. Absolutamente fora da gramática, esqueço a regra de ser super simpática. O som casou e o mundo ficou mais triste. Alguém desafina, por favor, que essa danada da repetição faz o game ficar over. Fim. Poderia acabar por aqui. Ao invés de ponto, uma vírgula, por favor, maestro!Talvez eu queira experimentar as curvas da estrada de Santos. É preço alto não seguir em linha reta, eu sei. No cheque pré, deixo margem pros erros e tropeços. Prefiro o descompasso do que dez com passo de um. Que Jeans tamanho único nunca me caiu bem nas pernas.

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Red

O espelho me acusa de sumiço. Em cinco minutos o dedo suja meus lábios com batom cor de sangue.
Como quem sublinha em letras garrafais o segredo mais elementar da humanidade: somos todos feitos de carne. Somos todos VERMELHOS.
Vermelho-vontade… Ferrari-rubi.
Ao virar meu olhar para a esquerda, lembro da China comunista e me aquieto por cinco minutos.
Os cinco minutos me são caros vermelho dor de coração.
Vermelho que arranha a garganta num grito que me diz mulher.
Cabelos castanhos que se querem ruivos. Uivos. O vinho é tinto, por favor.

Vontade de me chamar Eva. Que pecado, se fôsse côr, não teria dúvida.
Lua cheia, intensa que só ela, como fêmea que menstrua e experimenta a gula de cerejas.
Desejo que soa como arte marcial: na luta a faixa vermelha é a mais difícil de ser obtida.
Difícil conter esse Vermelho que se catapora de significados….
Que Vermelho é moça arteira.
E arte não entende de discrição.

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Michael-Jackson-p06 As avós já diziam: “É de menino que se torce o pepino.” E alguém era burro de tentar segurar aquele moleque com ginga de negão que fez o queixo de todo mundo cair com seu passinho para trás que todo mundo tentava imitar e ficava amador. Da Motown à Marte, se bobear, quis dar uma passadinha na lua com seu moonwalk. O grande inventor do grande passinho do século XX. Se bobear até um pivete de cinco anos de hoje ainda vai tentar imitar. E quando tentar seu pai vai cantar “Thriller”. O garoto vai gostar sem saber de quem é. E o pai vai dizer que fez muito aquilo nas festinhas.

O mundo não consultou Hitchkock para mudar o significado da palavra Thriller. Em 1982 o nosso menino da Terra do Nunca resolveu fazer seu próprio cinema. Deu o nome de vídeoclip quando botou a imagem pra namorar sua música ainda com sotaque de negão. Sotaquezinho bom esse com cara de língua oficial ou como é que a gente chama o disco mais ouvido na história?

Quem sabe o Olodum que batucou em seu clip no Brasil passe um fax-batucada como um lamento de fãs como eu para  o tchau do menino que encheu daqueles adultos insuportáveis do showbussiness, famintos atrás de resultados que não deixaram mais ele brincar por aqui até que fizesse um novo hit. O menino ficou bravo com tanta pressão. Resolveu se esconder. Botou máscara para ninguém lhe achar. Escondeu-se tão bem que nem ele mesmo se descobriu.

Quem sabe lá no céu nosso astro do pop, que se achava estranho por ter talento numa terra do nunca ser, mas sempre parecer; quem sabe por lá nosso hitchmaker de porcelana possa voltar a sorrir e inventar mais um passo para essa humanidade que não pára de correr sem saber para onde ir.

Dica da semana:

O talento do nosso Michael Jackson vale um momento cabecinha no almofadão para rever Thriller, Bad, I will be there e ABC entre outras. Um pouco de côr nas almofadas, please: Helena Castello Branco – Patchwork

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Chocolate

Chocolate…
Em Francês fica mais bonito. Ainda mais se o filme tiver a Juliett Binochet
com seus dedos sujos e sem culpa.

Chocolate…
Ainda me ponho em situação afetiva com o pai de minha mãe, a quem chamo de “vô”, através de uma caixa de bombons.

É quando a mão estendida surge oferecendo-lhe doçuras.

A mesma doçura que ele disfarça com a distância de um exímio professor ao explicar-me, firme e eloquente, as matérias escolares.

Aquelas que eu queria não entender só para ouví-lo.

Silenciosa, nutria-me de afeto a cada pergunta respondida.

Chocolates me faltam no sumiço do diálogo com o marido de minha mãe, a quem
chamo de “paiê”.

Quis tantas vezes oferecer-lhe chocolate ao leite, mas na hora agá, o sabor era amargo: “Vou ficar assim, exagerada como você?”

Em notas de rodapé tamanho 8, permito-me o não-dito: “exagerada sim, mas adorável, como um bom Chocolate…”

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Auxiliar de portaria

Perguntei quem era ele. Contou-me de sua doença. Operaria amanhã. Voltei a perguntar quem era ele. Disse que havia se aposentado. Insisti que a pergunta ainda não tinha resposta. Vendo que a mãe lhe deu um nome diferente de “diagnóstico”, desembuchou: “eu fui um auxiliar de portaria”. Tinha tudo para pensar “ah, tá, um porteiro”. Aquela dedução lógica não fazia par com o tom do discurso dele. Tinha pompa. Tinha orgulho. Tinha amor. E continuou:” Sabe o que é auxiliar de portaria?”. Seu olhar de quem tem história para contar, me fez ver que a vida não pode ser tão lógica que minha resposta resuma-se em “ah, tá, um porteiro”. Escutar me parecia muito mais rico que falar qualquer coisa. Ele não titubeou: “Um auxiliar de portaria é nada mais nada menos que a porta de entrada de um estabelecimento”. Eu vou perder isso. Deixei que continuasse: “Isso não é pouca coisa não. Muita gente já me pediu informação. E dependendo do meu jeito de recebe-las elas vão subir para falar com o presidente da empresa de um jeito ou de outro. Além do que, muita gente importante já apertou a minha mão e precisou da minha ajuda para não se perder aqui dentro. Fora os que resolvem puxar assunto, enquanto não chega o elevador e me contam a vida toda. Talvez ninguém da família saiba coisas que eu soube. Ai que saudade de acordar com as galinhas, fazer a barba, vestir meu uniforme…”.

Chegou a hora de ouvir outras histórias de outras pessoas. Despedi-me com a absoluta certeza que valeu a pena insistir na pergunta, quando a resposta ainda não fez bem à alma. Ele não se chamava diagnóstico, nem era o leito “y” que operaria no dia seguinte. Ele era o auxiliar de portaria.

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Um, dois, três e já!

Estava no mar, avistou lá longe uma onda que se aproximava dela. Era pequenina estava só nascendo. O medo veio sem ser convidado e mal chegou foi enchendo a bola da onda. Toda cheia de si, foi crescendo, crescendo. O tempo severo disse-lhe sem tirar nem pôr. “Decida: ou fura a onda, ou ela te devora”. Não tinha a mamata de parar e pensar na morte da bezerra, nas dores da vida, no que deixou de fazer, no que sempre sonhou e não realizou, no que tinha virado. Ali foi um, dois, três e já! Seu pai deu-lhe um caldo e “glub”, pronto: fechou os olhos, furou a onda e finalmente enxergou a verdade verdadeira: a onda só virou gigante quando o medo encheu a bola dela.

Saudade de furar uma onda…

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Radiografia de dentes

Pediu-lhe que fizesse uma radiografia. Entraria para a arcada dos 30. Balzac não previu a mudança na constituição óssea para as de 30. Tudo bem, tem muito doutor em dentes que nunca passou da página 4 de um livro. Fê-lo. As cáries foram do céu da boca ao inferno da gengiva vermelho sangue. Elas não perdoam as gulosas por doce. Que o pecado se não evitado, no mínimo faz-se necessário disfarce. Beijo na alma do inventor de creme dental. Pena que o sono, várias, dispensou-a da perfeita higiene bucal. O açúcar espalhou-se em todas as almofadas. Sisos, dentes da frente, não poupou qualquer lateral. Garrincha ficaria com inveja dos dribles. Pontos pretos oferecem à face ao dentista como tantas outras escuridões de nós. Game over. Quem mandou esconder-se da cadeira do tio tanto tempo! Quem mandou esconder sujeira debaixo do tapete! Mínimo de 6 sessões. Que droga, podia ter inventado lorota para não fazer radiografia. Dizia que confiava na vista do doutor. Que a olho nu, só identificara uma dupla. Como fazem os apaixonados que acham um a dois defeitinhos no máximo no objeto de devoção. Chegada em casa, ligou para a bola da vez. Ao encontro deixaria porção de sedução na gaveta de casa. Abriria a arcada dentária da alma. Tinha pontos pretos, que os visse logo. Que depois de algum tempo não se aceita devolução de mercadoria. Foram localizadas na base cáries evidentes: unhas roídas, um punhado de impaciência, bocado de ansiedade, intensidade acima do normal, persistência rasa, pneus no estômago, umas marcas de expressão precoces, um cálice de agressividade. Nada que um bom flúor lotado de afeto, bem querer, vontade de dar certo, humor, carinho, aconchego não desse jeito na louça. Lavada a porcelana, a moça prosseguiu gostada. Que no diagnóstico da radiografia lia-se: “humana”.

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À vista, sem prazos

“Não me procure antes de dois dias”.

Quem determinou que o prazo de esquecimento de uma briga é de 48 horas?!Nem Deus sabia direito que o mundo se faria em 7 dias… Foi fazendo.

Sua intensidade soava como dívida de Banco. Banco a gente senta para se acalmar. Instituição Financeira, pronto!

Ouviu da intensidade dos seus tons. E quem disse que queria deixar de gostar de rosa com roxo!

Sua alegria que soava alergia quando ninguém se entendia.

Coisa de alguém que não tem olhos de vê-la como ela é. Filme que se passa imaginando o que poderia ter sido. Como quem brinca de diretor sem saber que o outro artista pode merecer o aplauso.

Vontade de não ter ninguém pedindo férias ao seu lado. Que a vida alheia fica a preço de banana se pra cada atrito entra-se para o arquivo das desimportâncias.

Onde sobram egos, falta eco.

Talvez o real gosto da felicidade namore bem com a textura da boa comunicação. Falar o que se pensa sem pensar no que o outro diz é alugar um dois quartos achando que é conjugado.

Falar com verdade, sempre pintou quadro mais bonito que impor limites.

Comunicação é muito mais jeitosa quando as regras trocam seus nervos de aço por vestido soltinho no corpo.

Mais terra molhada de não argumentos, de não competições. Olharia mais para quem a julgasse menos.

Recebeu um telefonema… Não era o de sempre. E dai! Tinha seu quilate.

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Beatriz

Olha… Será que ela é moça? Será que é de éter? Será que é loucura?Será que ela mora num arranha céu? E se eu pudesse entrar na sua vida…

A moça não chamava Beatriz desde todo sempre. Chico resolveu chamá-la assim já homem formado. A menina parece que chamava Bibi quando a outra tinha lá suas sete primaveras. A Bibi tinha a vida muito limitada. Ela esperava o príncipe encantado, tinha que se maquiar para esperá-lo em seu vestido rosa com sandália de cristal. Bibi não precisava pensar em nada. Sua dona fazia-lhe os movimentos e sonhos.

Bibi se foi em fins dos anos doces infantis. Para não entristecer, dona pegou emprestada a vida de bonecos que andavam por si só. Pessoas que falavam como ela. De posse de papel e caneta tramou seus possíveis movimentos. Quem será aquele lá? Aquela criatura que me esperta curiosidade e afeto. No que pensa? Faz tudo o que pensa? Pensa no que faz? Gosta de rosas vermelhas mesmo ou diz que gosta porque fica romântico? Toma café puro pra não topar com o açúcar ou precisa sentir o aroma do café puro? Cozinha maravilhas para si ou sempre fica a espera do outro para inspirar um molho dos deuses? Prefere roça à Provence? Mas se o vinho for branco gelado com trufas brancas numa casa no campo nada mal? Arranha
cantarolar Tudo é divino maravilhoso quando põe o dedão na cachoeira as sete da matina, todos dormindo, menos os pássaros e borboletas?

O dedo molha e dona acorda. Bibi, hoje Beatriz, não está num arranha céu, na Provence, nem na casa de campo. Está ali, ali, ali numa das esquinas da sua vida. Uma vida que ela nada disse a respeito. Ninguém perguntou. Criou.

Dia desses alguém soprou no tímpano da tal que não pediu licença para inventar a vida dos outros: “você se apaixona pelo amor. Beatriz faz só cócegas pro amor surgir. O amor é a coceirinha que faz criar, brilhar, inventar, saber quem se é pela palavra bem, quista, bendita, bem lavada”.

Deixou Beatriz em paz. Tampou a caneta e saiu feliz. Sergio, nome ouvido para chamar o moço do posto de gasolina da esquina já lhe interessava mais.

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